quinta-feira, 23 de junho de 2011

Sobre Segredos Irresistíveis

Sobre Segredos Irresistíveis

Essa história que hoje lhes conto, amigos, além de um segredo, poderá lhes parecer demasiado exagerada; talvez até um pouco grosseira, se comparada a realidade; nada tocaria na sutileza da verdade. É engraçado saber que não conseguirei passar nem próximo de atingir a magia real que aquele momento teve; é triste, triste como é um morto, triste saber que não poderei reviver mais nenhuma vez aquela noite, sendo que eu o queria fazer milhares outras vezes, para decorar cada segundo, reparar em cada milésimo, aproveitar desde cada fragmento de sua fragrância até o último de seus suspiros.
Mas não se exaltem, que começo agora, a contar-lhes.
É verão agora, assim como era naquele dia. Prefiro essas estações mais quentes e amenas; também, o calor do clima deixa as pessoas mais calorosas. De qualquer forma estava eu deitado no colo de minha amada – não parece ser verdade, olhando agora, o fato de que, até próximo deste momento, ela nada conhecia do meu amor por ela. Enfim, estava eu deitado ao colo de minha amada, ela lentamente afagava meus cabelos com a mão esquerda, enquanto a direita estava entrelaçada com as minhas mãos, repousando em meu peito. Conversávamos sobre amenidades com as pessoas a nossa volta; particularmente, eu nada ouvia além do que saía daquela boca, daqueles lábios que eu tanto desejava, e ali, a centímetros de mim, estavam.
Por mais que tentasse, eu não conseguiria esconder o olhar abobalhado que eu ficava, enquanto a olhava. Tive bastante tempo, então procurei conhecer pedaço por pedaço daquele rosto. Eu poderia dela fazer aqui um retrato, nesse momento, mas não devo, que nada superará o brilho daqueles olhos, o cheiro daquele corpo, os movimentos daqueles lábios ou o leve toque da sua voz. O melhor que posso lhes fazer seria: da próxima vez que estiverem com uma mulher lindíssima que te gerem uma paixão imensa, multipliquem a beleza da senhorita pelo quanto meu coração acelera ao ver minha amada; somem na paixão todas as outras paixões que já sentiram ou virão ainda a sentir, e aí talvez cheguem próximos da realidade.
Ao que interessa: Logo que ficamos sozinhos, resolvi declarar-me, e despejei todo o meu Latim, meu Grego, meu Alemão e todas as outras línguas que me foram necessárias para tentar explicar tudo o que eu sentia, tudo o que eu desejava, o quanto a desejava... A este momento eu já havia desistido de ficar deitado, sentando-me muito próximo dela, quase que lha beijando os lábios. E, por uma benção, por sorte, por vontade, loucura, paixão, amor, finalmente nos beijamos. Foi como um estrondo em todo meu corpo; senti-me como se nunca houvesse beijado antes, como se ela fosse sagrada, como se trouxesse um caldeirão de água fervente e o jogasse em meu coração.
Após aquele beijo houveram mais outros, e as sensações foram mudando: a água quente se transformou em euforia, que logo transformou-se numa felicidade absurda; a felicidade se transformou em desejo, o desejo se tornaria loucura, a loucura, frio, e então o frio voltaria a ser euforia. Finalmente terminou brilhando alto, acima das nuvens, das estrelas, dos universos, no ponto mais alto aonde nada o tocaria, nem nada o atingiria ou profanaria, finalmente, um delicioso, puro e irresistível amor.


Augusto Môro

domingo, 10 de abril de 2011

Desnecessários

Desnecessários

O suéter que vesti pela manhã cheirava inteiramente a ela.
A noite de domingo não tinha sido fácil; prantos e mais prantos, cansaços, dores. Uma crise daquele tamanho não deve ser fácil de enfrentar. Qual foi a crise e os pormenores da peleja pouco importam, o realmente extraordinário foi ela ter recorrido a mim para socorrê-la.
Recebi sua ligação já passavam das oito da noite. Eu estava em casa, preparando-me parar dormir. Fiquei tão assustado de ouvi-la em prantos – achei que as lágrimas eram por minha causa – que coloquei meu suéter verde musgo velho, sem camisa por baixo, a primeira calça que encontrei e meu sapato sem meias. Cheguei à casa dela ofegante, vermelho como maratonista, ao ponto de precisar tomar alguns minutos ao portão, para recuperar a estirpe. Toquei a campainha, sua mãe me atendeu e me dirigiu ao quarto aonde se encontrava trancada a senhorita. Quanto bati à porta e chamei-a pelo nome, uma fresta se abriu, uma que eu mal conseguia passar. Entrei.
Chorava muito, eu me desesperei mais ainda. É difícil ver a pessoa que se ama em prantos.
Abracei-a, somente (àquele momento já sabia eu que ela não chorava por minha causa). Eu estava realmente atônito, inteiramente atônito. O nome dela, baixinho e com a voz pesada, foi a única coisa que consegui dizer após vários minutos do meu ombro molhado. O outro ombro já havia se molhado inteiro quando pensei em algo pra dizer.
“Estou aqui, se acalme...” grande coisa, não? Não, partindo do pressuposto que era eu quem o dizia; particularmente sou muito mais fraco que ela, não sou bom pra manter minha opinião, nem lidar com decisões. Sou um covarde, em verdade. Odeio fazer os outros tristes. Por mais que eu seja um mestre em fazê-lo.
“Vamos, pare de chorar, erga esse rosto...” ergui o rosto dela meio à força, puxando-a pelo queixo; fantástico como ainda estava linda, mesmo com os olhos inchados, o rosto vermelho e pouco ofegante, e aquela roupa pouco elegante de se ficar em casa. Linda.
“Pare com isso, se esforce pra manter o rosto erguido...” Pois ela se recusava a continuar me olhando. Aliás, estava toda fechada, os braços cruzados, as pernas recolhidas. Abri a fortaleza com outro abraço, e mais lágrimas vieram.
“Eu sei que é difícil, eu sei. Mas você tem de se esforçar, você é tão forte...” e por mais que ela insistisse em se dizer fraca, nós dois sabemos o quanto ela é forte. Mas a tristeza, essa sim sabe o que faz com nossa consciência. Quando você se sente um nada, quando se abraça a lama do fundo, você se sente fraco. Por mais que seja fortíssimo só de ter agüentado a queda.
“Esqueçamos disso, hã?” eu disse, após algumas horas. “Falemos sobre outra coisa.” propus, por mais que nem eu soubesse do que mais falar. Disse em seguida alguma piada que claramente não coube no momento, e a fez se arrepender de ter recorrido a mim, por mais que momentaneamente.
“Quer ouvir uma música?” não deu certo. “Está com fome?” não. “A janela aberta, quer que eu feche?” e o tanto faz que me fez reparar no quanto eu estava sendo patético foi a resposta.
Sentei-me então, levemente desolado e totalmente perdido. Eu faria o que fosse necessário para animá-la, dançaria como um macaco, cantaria música italiana, leria um Best-seller, qualquer coisa.
A frase mais importante que disse a ela, e que a fez desistir das lágrimas e ir comigo comer um pedaço de pudim na doçaria que ainda se encontrava aberta, lembro-me dela ser épica, empolgante. Mentira, esqueci-me totalmente. Não sei com que destreza lidei com ela, mas fomos comer o pudim mais salgado que já existiu. No caminho olhamos as estrelas, no caminho de ida. No de volta falamos tanto sobre nós dois e o nosso amor que há poucos dias tinha se desencontrado que esquecemos até de dobrar a terceira esquina à esquerda, que levava a sua casa. Declaramos-nos no portão, encontramos novamente nos olhos, no interior de nós dois o amor que sentíamos, aquele que se sente pela pele, pela pessoa, não por qualquer máscara que se veste. Ficou evidente naquele segundo porque ela tinha recorrido a mim. A noite de domingo, que era toda tempestades, tornou-se bonita como um raio.
E o suéter verde musgo velho que vesti hoje, pela manhã, cheirava inteiramente a ela. Entendem que isso tudo que contei serve só pra justificar o quanto isso é extraordinário?

Augusto Moro

sábado, 9 de abril de 2011

Acorde, se for capaz!

Acorde, se for capaz!

Sonhar é ótimo, não concordam? Sonhamos, todos, muito.
Não entendam mal o sentido de sonhar a que me refiro. Não é aquilo que você faz toda noite, quando dorme, e hora lembra, hora não. Digo sonhar acordado, iludir certas coisas; não de uma forma ruim, mas criar uma empolgação diante certa situação ou momento, ou pessoa, ou novo trabalho, ou qualquer outra coisa.
Quero me deter, no entanto, num ponto levemente diferente: quando se está vivendo um sonho.
É aí que vocês me dirão: “mas se você o está vivendo, não é mais um sonho!” e sim, vocês estão certos. Não inteiramente, mas certos.
Quando se vive um sonho, o tempo passa de uma forma diferente; o que aconteceu há um dia, parece que aconteceu há anos, e também o oposto, já que acontecimentos do ontem podem ser esquecidos como se tivessem ocorrido no começo dos tempos. Engraçado – e o mais delicioso – a vida vira uma miscelânea de realidade com extraordinário. Então ainda é um sonho, por mais que real. Ou é a realidade, turvada pelo fantástico.
“Que diabos?” vocês devem ter pensado. Explicar-me-ei: A vida parecerá ser boa demais pra ser verdade. E não o digo no sentido metafórico; acontece que você pára, pensa, reflete, e não consegue acreditar que está vivendo. Mas ainda existem as sensações, os gostos, os cheiros, os cansaços, as dores. Inteiramente, não há como ter exata consciência de se estar acordado ou dormindo, sonhando as perfeições que só nosso próprio subconsciente consegue gerar.
Não se enganem achando que eu não estou falando sobre amor, pois sim, estou. Sonhar com o trabalho, com alguma realização familiar, bem, qualquer outra coisa exceto o amor é possível. Mas nada, exceto amor e paixão, consegue fazer uma pessoa sonhar tão alto, sentir o tal fogo que arde sem se ver, feridas que doem de verdade e se sente sim, muito, aliás, e ainda se gosta de senti-las.
Talvez me achem clichê, por pensar isso do amor. Amigos, suas desilusões não passam de pó perto do momento em que vocês se sentirem inteiramente completos ao lado de uma pessoa. Provavelmente é nesse momento que vocês lavarão o rosto na esperança de acordar. Ou melhor, na esperança de não acordar.
As horas da noite ou do dia em que você encontrar-se completo vão passar voando, e cada segundo durará um dia; cada beijo vai acender todas as chamas possíveis, por mais que elas sejam mais puras que deveriam ser. Claro, os atos mais puros podem gerar desejos inexplicáveis. Nas pontas dos dedos ficarão as marcas de cada toque; poder-se-á relembrá-los a qualquer momento que desejar. Cada sorriso virará um riso, e cada riso se tornará uma gargalhada, até que os dois pararão, um pouco envergonhados, por estarem tão felizes só pela presença de um ao lado do outro. Os abraços serão constantes, um rápido toque dos lábios no pescoço gera um curto-circuito em todo o corpo, os perfumes serão deliciosos, o cheiro de suor misturado, o cheiro dos cremes, das sobremesas, dos cigarros, das bebidas, os gostos, tudo isso gerará um cheiro só de vocês. Aquele que você vai sentir logo ao acordar e se revirar na cama, esfregando o rosto no travesseiro. E isso não é tudo.
Tudo no seu coração, tudo na sua mente será a outra pessoa. Não será uma paranóia, não, certamente que não. É diferente, difícil de explicar, e incontrolável, fácil de sentir. Será automático recorrer a sua ‘outra-parte’ pra pedir forças, pra contar como foi seu dia, pra ligar num momento de desespero, ou num de felicidade, ou pra qualquer momento em que for necessário – e sim, todos serão. Ter a outra-parte ao seu lado, mesmo que seja parcialmente, será sua maior ambição.
Sentir-se completo, essa é a parte mais fantástica e ao mesmo tempo mais real, mais difícil e simplesmente elementar. Se eu fui infantil demais, ignorem o apaixonado. No entanto, se eu acertei, será fácil lembrar. E não se dêem ao trabalho de me dar razão, que razão é o mais fácil de perder quando se ama.

Augusto Môro